quarta-feira, 15 de julho de 2020

Existirá, e toda raça então experimentará; para todo mal, a cura

“E se virá / Será quando menos se esperar /
 Da onde ninguém imagina / Demolirá /
 Toda certeza vã / Não sobrará /
Pedra sobre pedra” (Lulu Santos)

Muitas séries famosas de TV exploram histórias de realidades paralelas. Apesar de não vivermos num mundo fictício da Netflix ou da HBO, às vezes temos essa mesma sensação estranha de distanciamento da realidade.

É o que estamos vivendo nessa época de pandemia. Muita gente parece simplesmente já ter desistido do isolamento, sem paciência depois de tanto tempo de quarentena, e está saindo às ruas como se não houvesse amanhã.

E talvez não haja mesmo para muitos de nós (toc! toc! toc! batendo três vezes na madeira), tendo em vista o número ainda crescente de infectados e mortos pela Covid-19. Se não fosse todo mundo de máscara e regado a álcool gel, nem lembraríamos mais do coronavírus.

Voltando ao mundo real (ou à realidade paralela), é realmente complexo entender o roteiro desse ano de 2020. Será que vivemos meses de isolamento social, em nome da ciência, para jogarmos tudo fora nesse momento de retomada das atividades econômicas e profissionais?

Ao contrário de outros países do mundo civilizado, o Brasil está reabrindo comércio, serviços, lazer, educação etc. numa fase em que ainda não atingimos uma curva decrescente de mortos - ao contrário, seguimos com índices elevados, bárbaros, desumanos.

Conhecemos todos os argumentos negacionistas e pragmáticos de que o brasileiro tem contas a pagar, que precisamos trabalhar, que o empresário necessita faturar e a economia deve voltar a girar. Ninguém discorda disso tudo.

Porém, e aquela conversa toda de ouvir a opinião de médicos e especialistas antes de liberar geral? Trocamos definitivamente a ciência e a medicina pela “bolsonarização” da saúde no Brasil?

Parece que adotamos um “foda-se” generalizado na gestão da crise. Virou um cada um por si e salve-se quem puder. A lotação das UTIs aumenta, enquanto hospitais de campanha caríssimos são desativados.

Escândalos de equipamentos superfaturados aparecem aqui e ali. Prefeitos e governadores pressionados pelas leis do mercado e confrontados pela lei de responsabilidade fiscal parecem desorientados, talvez por terem perdido o “timing” da quarentena.

A luta contra o coronavírus perde espaço para a guerra de narrativas e as batalhas políticas, ideológicas e eleitorais. A vida do ser humano não passa de estatística a ser jogada na base de dados de governantes, candidatos e partidos políticos.

Tanto faz, para eles, se eu e você vamos sobreviver. Interessa que a opinião pública e a maioria do eleitorado esteja convencida sobre quem tem razão. É o presidente que vai buscar a reeleição? É o prefeito, é o governador, é o nome forte da oposição?

Morrer faz parte. De doença, de fome, de velhice, assassinado por bandido ou pela polícia truculenta, isso é mero detalhe. Não dizem que a vida é um jogo? Pois nos tratam como peças manipuláveis num tabuleiro.

Valemos algo enquanto continuarmos vivos, claro. Servindo aos interesses deles. Nosso voto é nosso valor. Mas não podemos passar de números. Massa de manobra. Quando nos tornamos seres críticos, conscientes, questionadores, aí viramos um problema.

Somos milhões. Eles são quantos? Dezenas, centenas, milhares? Será que não chegou a hora de agirmos como um organismo vivo na nossa defesa imunológica? Fazer funcionar os mecanismos para impedir a multiplicação dessa doença que são os maus políticos?

Pense, respire, viva. Como dizia outra velha música: “Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Será que já não encontramos a cura?