sexta-feira, 30 de abril de 2021

Dizem que não há “clima” para o impeachment; ora, mas fazemos política ou meteorologia?


Se existe uma canção-símbolo da resistência democrática contra governos autoritários, ditatoriais, censores, opressores e assassinos da direita mais sórdida e canalha, como foi o pós-64 no Brasil, é “Pra não dizer que não falei das flores”, na voz de Geraldo Vandré.

Ainda que soe antiga (ou vintage, ou nostálgica), seus versos, a carga emocional, o papel histórico e a mensagem que carrega são eternos: “Vem, vamos embora, que esperar não é saber. Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Pois já passou da hora de fazermos acontecer novamente. Reage, Brasil!

Por muito menos, dois presidentes da República foram afastados do cargo desde a redemocratização, dois dos quatro que foram eleitos nas urnas (Bolsonaro é o quinto, dos infernos) e ambos em processos políticos e jurídicos iniciados no Congresso Nacional e respaldados pelo Supremo Tribunal Federal.

O ponto de partida dos processos de impeachment foram movimentos espontâneos e reduzidos na sociedade, totalmente desacreditados pelos partidos e pela imprensa, e com enorme probabilidade de insucesso. Mas, contrariando todas as previsões iniciais, Collor e Dilma caíram.

Em plena pandemia, com um inepto, lunático, golpista, negacionista, obscurantista e genocida ocupando a cadeira de presidente, os personagens de sempre desse mundo político convencional querem nos convencer que dessa vez não há “clima” para o impeachment de Bolsonaro.

O que é ter “clima”? Chamem aí os meteorologistas para nos governar! Cadê a moça do tempo na TV? O que falta para nos darmos conta da tragédia que é ter essa escória da humanidade desgovernando o Brasil? Esses 400 mil brasileiros mortos ainda não são suficientes?

Resta saber se nossa função cidadã é batalhar para criar o “clima” político ou apenas nos adaptarmos a ele. Nas páginas da História há lugar para protagonistas, coadjuvantes e figurantes. Cada um escolhe o papel que lhe parecer mais adequado.

A pedalada fiscal da então presidente Dilma Rousseff mobilizou e sensibilizou muito mais o Brasil. Bolsonaro dá pedaladas diárias na saúde, na economia, na ética, na probidade administrativa, no decoro, na educação, na cultura, na justiça, na vida. Sinal dos tempos.

Existe oposição ao desgoverno do presidente demente, é claro! Só de pedidos de impeachment já foram apresentados 115 até agora. Outros virão, incluindo um que pretende reunir oposicionistas de esquerda, centro e direita, talvez com maior poder de fogo. Veremos.

Há uma profusão de crimes de responsabilidade e de falta de decoro cometidos por Bolsonaro, pela familícia e pela corja que acompanha o atual inquilino do poder. Ministros incapazes, incompetentes, desqualificados, escolhidos à imagem e semelhança do chefe. Parlamentares que transitam da omissão à cumplicidade.

Uns preferem esperar. É a tese de deixar o governo “sangrar” até 2022 para vencermos Bolsonaro na eleição. Mas esse sangramento não é só do presidente. É também do povo, da democracia, das instituições republicanas. Todos feridos de morte.

Será que chegaremos vivos à sucessão presidencial? Quantos de nós morreremos ainda devido à irresponsabilidade criminosa do bolsonarismo, às fake news, aos ataques à liberdade e aos atentados contra o estado democrático de direito? O que terá restado deste país no final de 2022 se não sobrevivermos a essa besta até lá?