terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Contra energúmenos, pirralhos, putas, gays, mulher feia, ambientalistas, artistas, partidos, juízes, opositores, a ciência, o marxismo cultural e a esquerdalha em geral

Falei aqui, outro dia mesmo, daqueles que para mim foram os quatro filmes do ano: o brasileiro Bacurau, o norte-americano Coringa, o argentino A Odisséia dos Tontos e o coreano Parasita (reveja no "rascunho do balanço de 2019").

São alegorias emblemáticas e bastante significativas deste momento que vivemos, peças complementares de um quebra-cabeça complexo da política global e das relações humanas em plena era revolucionária das redes (anti) sociais.

Historicamente, o homem registra a sua realidade através do olhar mágico das artes, da cultura, do teatro, da música, do cinema. Não por acaso, os maus políticos, censores, ditadores e fascistas atacam justamente a cultura para restringir os direitos e as liberdades dos povos. 

Veja que esses filmes mencionados acima são de países que vivem realidades políticas, sociais, culturais e econômicas absolutamente caóticas, com líderes fracos e governos em crise: o Brasil de Jair Bolsonaro; os Estados Unidos de Donald Trump; a Argentina na transição entre o neoliberalismo de Mauricio Macri e o retorno do kirchnerismo com Alberto Fernández; e a Coréia, bem menos problemática ao Sul do que na sua vizinha do Norte, com o homem-bomba Kim Jong-un, embora o filme sulista retrate que nem tudo são flores naquele que consideramos um oásis asiático.

Quando Bacurau expõe a sua fictícia caçada humana como um jogo tecnológico cercado de drones para transmissão online, será que isso difere muito do estado em que um governador sai de helicóptero para disparar rajadas de metralhadora contra comunidades miseráveis e manda a polícia mirar "na cabecinha", como se fossem todos jogadores do filme contra suas vítimas aleatórias?

Ou a ficção não está ainda muito aquém da selvageria real de um país em que rinhas de cães são desbaratadas, com dezenas de animais feridos e mortos após lutarem para satisfazer o prazer mórbido de gente má, desumana e sem caráter, que aposta dinheiro no sofrimento dos bichos e assiste tudo in loco ou tranquilamente de suas casas por meio de transmissões pela internet?

O que dizer de um governo que ofende pessoalmente algumas das suas maiores expressões artísticas, ídolos populares reverenciados no mundo todo, como Fernanda Montenegro ou Chico Buarque, mas que para os atuais inquilinos do poder merecem ser atacados e insultados simplesmente porque se opõem à calhordice ideológica desses lunáticos terraplanistas e saudosos da ditadura, da censura e da tortura?

E não são situações isoladas, mas que traduzem o modus operandi do bolsonarismo. Faz parte da tática e da estratégia bolsonarista. Tem método. É a práxis. Quanto mais cortinas de fumaça para entreter o povo, melhor para eles. E dá-lhe ataque contra a "pirralha" Greta, o incendiário Leonardo DiCaprio, a puta Bruna Surfistinha, as ONGs, os gays, a mulher do Macron, o pai da Bachelet, a morte da Marielle, a Folha, a Globo, os partidos, as esquerdas, os comunistas, o STF, a OAB, o Papa e a PQP. Assim se constrói o boçalnarismo e a tal Aliança pelo Brasil.

Ora, nas regras da boa educação, da civilidade e das boas maneiras aprendemos que numa discussão não se deve usar o "argumentum ad hominem" (no latim, "argumento contra a pessoa") para discordar, negar ou criticar a opinião alheia. Devemos focar no conteúdo e não no autor da ideia. 

Mas o que dizer quando o presidente da República chama de "energúmeno" o patrono da educação brasileira? Ou seu ministro da DesEducação, um comediante frustrado com mentalidade e comportamento infantiloide, xinga de "bobo" e "feio" o mesmo Paulo Freire, referência universal e atemporal de educador, principalmente na alfabetização de adultos?

Como fugir da personificação da crítica quando um ministro (do extermínio) do Meio Ambiente debocha do aquecimento global e das mudanças climáticas, incentiva o desmatamento das florestas, patrocina o uso de agrotóxicos proibidos no resto do mundo e ainda celebra o insucesso da uma conferência ambiental da ONU após uma participação vexatória como representante oficial do seu país?

Não tem como não dar nome aos bois, ou a esse gado bolsonarista: Jair Bolsonaro, Abraham Weintraub, Ricardo Salles, Damares Alves, Ernesto Araujo, Olavo de Carvalho e tantos outros dessa mesma estirpe são simplesmente boçais, despreparados, desqualificados, desequilibrados. Fraquejada da democracia. Lixo não reciclável que entrou para a História do Brasil mas precisa logo ser mais uma página virada, para retomarmos os rumos da boa política e fazermos a civilização voltar a vencer a barbárie.

Mauricio Huertas é jornalista, líder RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade), editor do #Suprapartidário, idealizador do #CâmaraMan e apresentador do #ProgramaDiferente.