segunda-feira, 4 de outubro de 2021

Para entender a voz das ruas


A manifestação recente que levou mais gente às ruas foi, sem nenhuma dúvida, a de 7 de setembro, convocada pelo próprio presidente, planejada e estruturada (financiada, inclusive) por apoiadores diversos do bolsonarismo, vários deles ocupantes de cargos públicos.

A mamata e o pão com mortadela, tão mencionados pelos bolsonaristas para atacar os protestos da oposição e acusar os manifestantes de “vendidos”, parecem ter mudado de lado. O que se viu foi transporte, hospedagem e alimentação - tudo pago - para apoiadores de Bolsonaro vindos de todo o Brasil para a Avenida Paulista.

É legítimo? Ora, são as armas emblemáticas mais à mão da política e da democracia, à direita e à esquerda. É legal? É moral? Não cabe aqui, neste momento, investigação ou julgamento. De onde vem o dinheiro? A polícia que investigue essa história e essa escória.

Mas a proposta aqui é outra. Vamos refletir o que leva as pessoas às ruas nessas grandes mobilizações populares, algumas espontâneas, outras tantas exaustivamente programadas e divulgadas (e nem assim com sucesso garantido).

As manifestações são cíclicas e variam com o contexto, o humor e até a ideologia da ocasião - como é a própria política. A tal Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que precedeu os 21 anos da ditadura (de 1964 a 1985) é a que mais se assemelha com os atos bolsonaristas de hoje em dia.

A grande resposta dos opositores da ditadura foram as Diretas Já - que reuniram multidões em praça pública e alinharam todos os partidos e lideranças políticas vivas daquele momento histórico crucial. Esse é o espírito que deveria predominar no #ForaBolsonaro. E por que isso não ocorre?

Em grande medida as redes substituem as ruas para dar voz aos cidadãos. Também estamos a apenas um ano de banir o bolsonarismo nas urnas. É improvável - embora fosse necessário e plenamente justificável - o afastamento desse presidente demente em tão curto prazo.

Neste outubro de 2021, os interesses eleitorais e partidários de cada presidenciável são maiores que a real expectativa de haver outro impeachment, até porque o Congresso segue domesticado por cargos e verbas. São os sobreviventes de todas as manifestações anteriores e dos esquemas tradicionais que seguem dando as cartas do poder.

Há velhos e novos nostálgicos da ditadura, zumbis apologistas do golpe e políticos oriundos de cada um dos movimentos importantes ocorridos no Brasil: da geração das Diretas, dos fiscais do Sarney, dos caras-pintadas, da turma do Plano Real, do Lula-lá, do Mensalão, da onda de 2013, da Lava Jato, dos movimentos cívicos de 2018 etc.

Paira uma certa desesperança e frustração que desmotiva o povo a ir às ruas, porque sempre o que se anunciava como “novo” em oposição ao que aí está e leva a maioria do eleitorado a comprar essa ideia, acaba por se desmanchar no ar ou revelar-se mais do mesmo.

O bolsonarismo foi consequência direta do antipetismo. O que virá como resultado do antibolsonarismo? De novo o petismo? Alguma novidade nessa maçaroca surreal denominada 3ª via? Esse receio e essa incerteza desmotivam e imobilizam muita gente que poderia estar nas ruas. A maioria quer mudar. Mas como? Em que direção? Com quem?