quinta-feira, 25 de junho de 2020

Por um Brasil com água e esgoto para todos

São 100 milhões de brasileiros sem coleta de esgoto e 35 milhões de brasileiros sem água tratada. Uma vergonha!

Muito se fala hoje sobre a aprovação do novo marco legal do saneamento básico, como esperança para melhorar a qualidade de vida, enfrentar a crise sanitária e diminuir essa miséria e a desigualdade vexatórias para o Brasil.

O projeto recém-aprovado é de iniciativa do governo. Facilita a privatização de estatais do setor e extingue o modelo atual de contrato entre os municípios e as empresas estaduais. Estabelece metas e punições para quem não entrega água tratada e esgoto.

Parte da oposição foi contra. Alega que o momento deveria ser exclusivamente de combate à pandemia e que as novas regras podem não resolver a crise e, no final, ainda acabar pesando no bolso do consumidor com preços abusivos.

Pelas regras em vigor, as companhias precisam obedecer a critérios de prestação de serviços e tarifação, mas podem atuar sem concorrência.

O novo marco transforma os contratos atuais em concessões às empresas que vierem a assumir o abastecimento de água e o tratamento de esgoto, além de tornar obrigatória a abertura de licitação, envolvendo empresas públicas e privadas.


Quem perde e quem ganha

Um ponto para o debate: Obviamente todos concordamos com a necessidade urgente do saneamento no Brasil. Está aí a crise sanitária que nos mostra diariamente o mapa do caos.

Este novo marco regulatório é necessário justamente porque nem as estatais nem as empresas já privatizadas do setor vem cumprindo as metas e atenuando a crise. Vamos ver se essa nova concorrência pelos serviços vai melhorar a situação. Esperamos que sim.

Uma questão, porém, segue intrigante com a privatização: como o serviço de água e esgoto será lucrativo no País a curto e médio prazo, principalmente diante dos investimentos necessários e da miséria de grande parte da população?

Veja, somos favoráveis ao enfrentamento deste problema crônico no Brasil. Mas não podemos ignorar pontos concretos e objetivos para debatermos, principalmente neste contexto de crise e do óbvio interesse do lucro das empresas.

Por que não se investe tanto quanto necessário em saneamento? Porque é caro, complexo e há uma carência imensa. A questão é: Por que então empresas privadas se interessariam por estes serviços de água e esgoto? Por patriotismo não deve ser. Querem lucrar, mas como?

Que sejam criados mecanismos para impedir que a briga pela privatização se dê nos grandes centros, enquanto as áreas mais carentes e necessitadas sigam desassistidas. E também para vetar que se cobrem preços injustos e exorbitantes por serviços essenciais.

Áreas ricas e áreas pobres

Veja o que ocorre em São Paulo, por exemplo, com a privatização de parques públicos. Todo mundo quer o Ibirapuera, ninguém quer aqueles espaços de periferia. Os pacotes (quem ganha uma região nobre leva junto outras tantas carentes) talvez sejam um caminho.

Citemos outros serviços privatizados, tais como o transporte coletivo, que além de não atender a população como deveria, ainda custa bilhões aos cofres públicos por meio de subsídios estatais. E o monopólio segue firme, como neste caso das empresas de ônibus.

Não somos contra as privatizações, nem fãs de monopólios estatais. O que vemos é uma diferença imensa entre uma empresa ter lucro com o investimento em transportes ou telecomunicações, por exemplo, ou em redes de esgoto. Para citar alguns setores privatizados no Brasil. Mas, enfim, aguardemos.

Modelos a seguir

A Sabesp, companhia de água e esgoto de São Paulo, é considerada o padrão de empresa a ser seguido, mas está bem longe da realidade nacional. 

Por outro lado, a Cedae, companhia de abastecimento do Rio, ficou famosa por fornecer água contaminada com esgoto à população.

O Brasil quer entregar o seu saneamento, nas próximas décadas, a uma grande Sabesp ou uma grande Cedae?

Por vários motivos - econômicos, sociais, geográficos, políticos - não dá para ter a Sabesp como modelo viável nacionalmente, embora fosse o ideal. Mas é importante evitar o padrão Cedae.

Isso porque São Paulo e Rio são as jóias da coroa para qualquer privatização. Mas vamos pensar a situação geral do Brasil, de norte a sul. Haja trabalho, planejamento e investimentos.

Além do aspecto humanitário, não podemos nos esquecer também do impacto ambiental do problema do saneamento. Cidades sustentáveis precisam de água e esgoto, obviamente. Porém, há todo um encadeamento de problemas sociais, habitacionais, culturais, urbanísticos.

Como levar água e esgoto a loteamentos clandestinos ou invasões ilegais em áreas de mananciais, como ocorre nas grandes metrópoles? Então, são desafios colocados aos gestores e a todos nós, eleitores responsáveis e cidadãos conscientes.

Enfim, esse novo marco do saneamento serve ao menos para começar a sacudir o setor, provocar discussões, reflexões e estimular mudanças.

Que não se perca em discursos e promessas vazias de políticos, nem em esquemas e negociatas. Vamos aguardar, fiscalizar e cobrar resultados.